O bolso é que dá a palavra final
Guia para entender o equilíbrio entre pagar as contas e desfrutar da vida
Desde que a televisão foi popularizada a gente vê o economista falando para “juntar dinheiro e só comprar à vista” em todos os jornais.
Um salto para a sociedade atual, temos coach de finanças aos baldes nas redes sociais e a gente, brasileiras e brasileiros, segue sem fechar a conta no fim do mês, mais endividado em 2024 que em 2023, como mostra a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic).
O estudo, feito pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e divulgado em julho, mostra que 78,5% das famílias brasileiras estão em uma relação conflituosa com o cartão de crédito, cheque especial, carnê de lojas, empréstimos e prestações de carro e casa.
Mas afinal, economizar no cafezinho após ao almoço não está rendendo? O brasileiro gasta mais do que tem? Ou o brasileiro ganha mal?
Hipóteses engraçadas e polêmicas à parte, bem sabemos que uma soma de fatores influencia o nosso poder de compra, ou falando em uma linguagem oposta a dos economistas engravatados do jornal, da nossa capacidade de comer uma pizza com a família no sábado, ou de fazer aquele churrasquinho no domingo, de não deixar passar o aniversário da criança em branco, “vem cantar parabéns com a gente, vai ser só um bolinho”! Sim, a conta chega e o bolinho vira um bolão, e lá estamos nós de novo na relação da galera endividada.
E é por isso que essa newsletter quer se aproximar do assunto considerando que o café, o churrasco e o parabéns têm os seus valores, além de econômicos, culturais e sociais e que dificilmente serão deixados de lado na sociedade em que vivemos.
Para isso, fomos conversar com o Núcleo dos Direitos do Consumidor que lida com a temática diariamente.
Ninguém vive só de boletos! Quem é que não quer aproveitar um churrasquinho no fim de semana, passar no salão para dar aquele trato no visual, ou tomar um refrigerante bem gelado?
Pois é, e tudo isso sem cair nas armadilhas do endividamento. A defensora pública Claudia Bossay Assumpção Fassa, do Nuccon, fala de maneira franca sobre como equilibrar o orçamento sem deixar de lado os pequenos prazeres da vida?
"A gente fala de quem muitas vezes ganha pouco, tem uma vida apertada, e aí? Como pedir para essa pessoa deixar de curtir o churrasquinho ou o salão? Não dá! A solução não é cortar de vez, mas sim programar os gastos", orienta.
Neste aspecto, a defensora vai direto ao ponto: "Você não precisa deixar de tomar o seu refrigerante ou comer o seu sanduíche. Mas é importante que isso entre na sua programação de gastos. Nada de gastar por impulso, afinal, o problema do endividamento começa quando o controle escapa pelos dedos. Daqui a pouco, você está devendo mais do que pode pagar e a dívida só cresce”, diz.
Organizar
Segundo a defensora, o planejamento de como gastar o seu dinheiro é essencial.
“Não é deixar de viver, mas saber onde e como gastar. A ideia não é cortar os pequenos prazeres, mas encaixá-los dentro do orçamento. E para isso, por mais difícil que seja, é bom ter uma reserva para emergências. A gente nunca sabe quando vai precisar de um remédio extra ou pegar um Uber para uma urgência. Os imprevistos acontecem e, se a pessoa estiver organizada, será menos doloroso", reflete.
Vale a pena correr atrás do mais barato?
Sabe aquela velha prática de percorrer vários mercados para achar o preço mais barato? Pois é, pode ser uma cilada.
"Às vezes, sair do bairro para comprar algo mais em conta pode sair mais caro", alerta.
Nessa hora, a defensora sugere que a pessoa coloque tudo "na ponta do lápis" para decidir.
“Não adianta economizar alguns centavos em um produto se o custo do transporte for mais alto, e ainda há o risco de comprar mais do que precisa ao chegar no supermercado”, pontua.
Calma, é temporário
Um dos maiores inimigos do orçamento, para Claudia, é o cartão de crédito mal utilizado.
"Você só paga o mínimo da fatura, e no mês seguinte o juro é uma loucura. O cartão, quando não bem utilizado, vira um buraco sem fim. A dica aqui é clara: cortar gastos é temporário. Talvez você precise deixar de comprar uma roupa ou jantar fora este mês, mas isso não vai durar para sempre".
Busque a Defensoria Pública
A defensora enfatiza que o básico tem que ser garantido: aluguel, água, luz e, hoje em dia, internet são essenciais.
"Essas contas precisam ser prioridade. Se a pessoa não consegue cobrir o básico, aí é hora de replanejar", aconselha.
E se mesmo assim a conta não fechar, buscar ajuda é fundamental.
"A Defensoria Pública está aí para ajudar a analisar as suas contas e organizar os seus documentos", lembra.
No final das contas, a mensagem da defensora é simples, mas poderosa: viver bem é possível, mesmo com um orçamento apertado. A dica de ouro? Planejar, priorizar e manter sempre os pés no chão. Afinal, o bolso é que dá a palavra final.
Atento à situação de endividamento das famílias sul-mato-grossenses, o Nuccon lançou o projeto “Saúde Financeira e Consumo - Prevenção ao Superendividamento”, que promover uma cultura de responsabilidade financeira.
“Eu percebi que não adiantava oferecermos, no núcleo, apenas um plano de pagamento, nossos assistidos e assistidas precisavam tratar isso na raiz, com a educação financeira” explica o coordenador do Nuccon, Carlos Eduardo Oliveira, no evento sobre o tema, realizado na Escola Superior da Defensoria na última semana.
Ainda em setembro, o assunto foi conversado com servidoras e servidores administrativos da Defensoria Pública-Geral.